Li e reli a postagem anterior com texto de Babalorixá Rivas Ty Ògìyàn, Babá Rivas, um grande zelador de santo, por mim chamado de modo carinhoso e devoto de meu pai de santo. O afeto nos possibilita dizer de forma não menos respeitosa e, com total reconhecimento e importância de seu cargo: zelador, zeladora, pai, mãe, Íyá, Babá, Mestre, Mestra, sacerdote ou sacerdotisa, enfim...
As religiões afro-brasileiras são tantas, que, para poder incluir a todxs, seria necessária uma lista enorme de nomenclaturas. São modos, formas que apontam para uma relação profunda de hierarquia que valoriza a sabedoria do mais velho ou da mais velha no santo, mas também nosso amor e respeito por eles ou elas. Assim, de modo não menos respeitoso, de qual religião afro-brasileira façam parte, eu os nominarei de pai ou mãe de santo em minhas postagens. Respeito sempre a diversidade das religiões afro-brasileiras e também os leitores e leitoras destas postagens que pertencem às mais diversas formas de fazer e praticar a religiosidade afro-brasileira. Prossigamos.
Falarei do carnaval, mas antes destacarei a minha emoção ao reencontrá-lo, meu Babá, meu pai de santo, nas linhas deste texto. Ele, com sua sabedoria atemporal. Ele, um ser humano para além das regras sociais convencionais. Ele, sempre tão profundo em suas abordagens e reflexões, nos chama de forma doce e profunda para repensarmos nossos preconceitos, nossas visões intransigentes, nossas inflexibilidades, nosso desdém ao que não “é nosso”.
Fala do carnaval como momentos em que as concepções sociais, políticas, econômicas, culturais e também religiosas se afrouxam para aparecer o ser humano escondido atrás delas. Momentos que aniquilam as desigualdades. Somos apenas seres humanos. Não tenho por hábito pular carnaval, mas sinto-me profundamente representada nestes dias. Dias de festa, alegria, bom ânimo, cumplicidade e explosão de realizar. É necessário ter “licença” para ser feliz, para largarmos as algemas impostas por uma sociedade cheia de desmandos.
Tocar, cantar, dançar, festejar, amar, solidarizar, fazer da vida uma efervescência, uma explosão dos limites leva nossa sociedade heterogênea a ser respeitosa de sua diversidade, ao menos nestes poucos dias, ao menos para estes grupos, que por dias comungam do mesmo caminho, do mesmo asfalto, da mesma “música” e da mesma ânsia de ser feliz. Talvez por isto a abertura destes dias seja denominada de grito de carnaval. Gritar pelo direito à felicidade, gritar por nossos direitos, gritar pela vida por meio da arte... O ato de se permitir a liberdade e momentos de felicidade.
Como disse meu amado e saudoso Babá, o carnaval é um amortecedor dos conflitos sociais... Dias em que a sociedade suspende sua capacidade inexorável de produção de miserabilidades para produzir felicidade e liberdade. Dois substantivos – abstratos – muito difíceis de serem vividos.
Saudades, meu Babá. Saudades de um mundo feliz e livre!
Mãe Maria Elise Rivas
Íyá Bê Ty Ogodô
Mestra Yamaracyê
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